quarta-feira, 28 de março de 2007

Marta Medeiros

Quem é que vai pagar por isso?



Foi com surpresa que me deparei outro dia com um costume que eu jurava que não existisse mais. Estava jantando num restaurante com meu namorado quando o garçom trouxe dois cardápios para a mesa. Ambos listando todos os pratos da casa, mas o meu, sem os preços.

Quem deve pagar a conta, afinal? Como se houvesse uma resposta única para uma questão tão complexa. Vamos resolver isso de uma vez por todas: no caso de ser apenas um casal de amigos, cada um paga a sua parte, a não ser que um queira fazer uma gentileza para o outro. O outro, elegantemente, retribuirá numa próxima vez.

Terminada a sessão amigos, vamos ao que interessa: encontros amorosos, sexuais ou matrimoniais. Queridas feministas, fiquem fora disso.

Se o homem convidou a mulher para jantar pela primeira vez, ele paga. Não tem acordo.

Se o homem convidou a mulher para jantar pela segunda vez, paga de novo. Se está meio duro, que a convide para um lugar modesto, sem problema.

Se esses jantares evoluíram para um namoro, ninguém mais está convidando, eles simplesmente combinaram de comer alguma coisa depois do cinema, então ela pode começar a pagar de vez em quando.

Se ele andou aprontando, sendo grosseiro ou pisando na bola, podem estar juntos há 20 anos: ele paga. Caro.

Se ela andou aprontando, sendo grosseira ou pisando na bola, ele paga também, para que ela não pense que as coisas se resolvem assim tão facilmente, com uma continha de restaurante.

Se ele não tem um tostão, está desempregado, quebrado, falido, mas compensa sendo um cara sensacional, ela paga quantas vezes for preciso (mas torcerá, em silêncio, para que essa situação seja passageira).

Se ela não tem onde cair morta, mas é tão doce que faz questão absoluta de pagar pelo menos uma vez na vida, ele a leva para comer um cachorro-quente e permite que rachem a conta.

Se os dois são milionários, ele paga.

Se os dois são duros, estão fazendo o que num restaurante?

Se o casamento está em crise, ele paga. Era só o que faltava fazê-la chorar e arcar com a conta ainda por cima.

Se o casamento está em plena lua-de-mel, ele paga. E vai achar barato.

Se ela é uma deusa e ele um medonho, ele paga.

Se ele é um gato e ela um tribufu, nada muda, ué: ele paga.

Se ele é um gato, um papo ótimo e uma cama melhor ainda, ela cozinha em casa para ele e nunca mais o deixa escapar.

Se ele é grosso, ignorante e mal-educado, ela paga a conta e pede licença para ir ao toalete, quando na verdade vai pegar um táxi para casa e providenciar a troca do número do telefone.

Se você não se encaixa em nenhuma dessas situações, ele paga.


Marta Medeiros, Revista O Globo, 25 de março de 2007

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